Acabei de lembrar a
história de um escritor louco judeu. Ele percorria as ruas da cidade com uma
gaiola na mão. Dizia que ia caçar ratos judeus. Era como se eu andasse por ai
com uma gaiola imaginária nas mãos. Só que eu não sabia exatamente o que caçar.
Cheguei do trabalho e
dei uma rápida passada em casa. Ainda no caminho, estranhei uma mendiga que
andava na rua importunando todo mundo. Era uma negra com uns trapos imundos.
Vestia shorts curtos e tinha belas coxas. Diminui o passo para não passar pelo
seu lado. Ela acabou atravessando a rua.
Deixei uns papeis em
casa e desci até o bar. No caminho, encontro novamente a mendiga louca. Desta
vez ela estava revirando uma lata de lixo, caçando seu jantar. De vez em quando
ela parava de mexer no lixo e começava a discutir com a lixeira. Deixei para lá
e segui meu rumo.
Gosto do boteco,
pessoas de todos os tipos. Velhos que bebem para esquecer ou relembrar,
comemorar ou lamentar. O porteiro de um prédio acabou de entrar. Estava
vestindo o uniforme de trabalho e um pouco bêbado também. Timidamente ele tirou
um vale transporte do bolso, chamou o cara do balcão, lhe mostrou o vale e
suplicou por uma dose de pinga. O rapaz deve ter ficado com pena e serviu uma
dose. O porteiro bebeu e foi embora.
Um cara da mesa ao
lado começou a rir da cena. Ele também estava bêbado. Também havia sido
porteiro. Foi demitido por trabalhar bêbado. Hoje ele continua tomando as dele.
A mendiga louca
também apareceu por lá. Seu fedor paralisou o boteco. As conversas cessaram e
todos ouviram ela pedir uma dose de pinga em um copo descartável. Pagou com
algumas moedas e foi embora. As conversas se restabeleceram.
Enquanto o porteiro
bebe para afastar o tédio de várias horas sentado em uma cadeira, o escritor
bebe para as palavras fluírem mais facilmente. A mendiga louca toma umas de vez
em quando só para diminuir a fome. Cada um com sua desculpa. Viva a democracia
etílica.