Um negão forte de
mais ou menos dois metros de altura entra no bar e senta em um dos bancos do
balcão. Seus olhos pareciam estar mergulhados em sangue. Pede uma cachaça.
“Qual?” “Qualquer uma”. Cardoso, o balconista, não se conteve e comentou comigo
em voz baixa: “É chifre, quer ver só?!”
- Qual foi o problema, amigão?
E o negão desaba a chorar, como se
fosse uma criança.
- Ele não podia ter feito isso comigo.
Eu fiz tudo por aquele vagabundo, o tirei da sarjeta e ele me trai logo com
aquela vaca. Desgraçado.
O bar ficou em silêncio para escutar o
negão. Sem saber o que dizer, Cardoso solta um: “Isso acontece, amigão”.
***
A noite vai se
aproximando e os primeiros sinais de embriaguez começam a aparecer. Um cara cai
do banquinho, se levanta e debruça no balcão. “É assim pelo menos uma vez na
semana. Daqui a pouco aparece o filho para resgatá-lo”, diz Cardoso.
O garoto chegou por
volta das nove. Viu o pai estirado no balcão e se sentou na minha mesa.
- Você tem quantos anos? – perguntei.
- Nove.
- E veio pegar seu pai?
- Foi.
Então o garoto se levantou e pegou um
limão no balcão. Voltou e começou a lamber o limão.
- É azedo. Você quer um pouco?
- Não, garoto. Obrigado. Ei, você é um
cara durão, sabia?
- É?
- É.
- Mas o limão vai ficar melhor se você
o espremer em um copo com água. O Cardoso deve ter açúcar.
O garoto tomou sua
limonada e esperou o pai dar um sinal de vida. O velho se mexeu lá pelas onze.
O garoto foi até ele, pegou sua mão e conseguiu tirar forças para arrastar o
pai.