quarta-feira, outubro 14, 2015

My Cracoland

Entre o limiar de desistir, esquecer, e alguns minutos de prazer.
Você virou as costas para o mundo, apenas como retribuição. Por cansaço, tristeza, depressão.

Aqui você se sente mais à vontade, é sua nova família. A dor se esvai pela latinha e volta com o peso de dois engradados. Para ela ir embora você precisa continuar aqui. Mas se for para sair, sei que voltarás. Minha única certeza. Voltarás.

Completar o ciclo. Esquecer as dores da outra vida, do outro mundo. Agora só existe essa aqui, intercalada com tragos e orgasmos.

Nada mais importa. No fundo, não queres mais nada. Porque sabes que só tens a mim. Eu sou a teia, você acha que é a aranha, mas é só um inseto.

Eu te amo.

sábado, outubro 03, 2015

Espelho

Lembre-se de quando você transbordava esperança. Das levezas da juventude. Da insegurança e das borboletas no estômago. Do primeiro grande amor, das primeiras desilusões. Das primeiras vezes. Mesmo nos dilemas da juventude, havia beleza. A vida tratou de ir te machucando com o passar dos anos. Algo se perdeu no meio do caminho. Algo mudou. O brilho cessou, o sorriso sumiu, você ressecou. Mas com as lembranças vieram as lágrimas, que trataram de hidratar a alma.

Coração etílico

Amor é um bêbado cambaleante na linha do trem. Caminhando sem rumo. É necessário correr o risco. Com o tempo, aprende-se a desviar dos trens. E então torna-se a andar embriagado na linha. Não perderás a vida, mas vagarás tropeçando,  pois sobriedade passa longe do amor. E quando a morte chegar, melhor que não estejas amando. Seria muito desperdício.

segunda-feira, setembro 07, 2015

A vida é isso aqui!

Me falaram para ir ao analista,
No candomblé,
Umbanda ou centro espírita.
Me sentir leve,
Tomar um passe,
Mas eu prefiro,
Uma dose de birita.
BARATAAAAA!!!!
(E outra pro "santo". hahahha)
Ir na cachu,
Os pés na areia,
Se energizar,
Que puta ASNEIRAAAAAAA!!!!!.
A vida é isso aqui,
BEM VINDO, BEM VINDO!
A vida é isso aqui,
BEM VINDO, BEM VINDO!
Milhares morrendo,
Fugindo da guerra,
E a gente aqui,
Fazendo (e falando) merda!
E mundo chora, chora, e lamenta,
No trabalho ou em casa...
Ninguém aguenta!
Punheta!!!!
Punheta!!!!
Punheta!!!!
Punheta Burguesa intelectual.
Porque quem lamenta,
Não faz merda nenhuma no final.
A vida é isso aqui,
BEM VINDO, BEM VINDO!
A vida é isso aqui,
BEM VINDO, BEM VINDO!
Chega em casa e pira com as paredes,
Não há ninguém pra ouvir ou aturar,
As baboseiras sobre como mudar.
A yoga,
O reiki ou o analista,
Toda essa merda me irrita!
A vida é isso aqui,
BEM VINDO, BEM VINDO!
A vida é isso aqui,
BEM VINDO, BEM VINDO!
Eu vou fugir,
Eu vou fugir!
Mas vou VOLTARRRRR!
Mas vou VOLTARRRRR!
Vai ser melhor que Jesus!
Vai ser melhor que Jesus!
Vai ser melhor que Jesus!
(cade ele, ele volta? Hahaha)

sexta-feira, maio 15, 2015

Quem dera...

Quem dera se o poeta tivesse mais força que o necessário para segurar a pena, 
Força suficiente para esmurrar idiotas.
Quem dera se o poeta tivesse menos pena e mais dinamite,
Para implodir toda a dor e injustiça do mundo.
Quem dera se o poeta fosse ladrão.
Para ao menos implodir caixa eletrônico,
Distribuir dinheiro,
Pagar seus tragos,
E no fim ficar sem nenhum puto na mão. 

segunda-feira, março 02, 2015

Aspone, Pretinho e a bike colorida

Fazer fortuna não era algo fácil, vindo de onde veio. Morador de favela, mulato, filho de uma empregada doméstica e de um porteiro, ele era a única prole. Trabalhou de lavador de carros a gerente de loja de departamento. Inteligente, conseguiu passar pra faculdade, ainda enquanto trabalhava na loja de departamentos, já um pouco mais velho pra média. Juntou dinheiro no trabalho e resolveu estudar para concurso. Depois de dois anos só voltado para os estudos aspones, como ele gostava de chamar, passou para um cargo de ASsistente de POrra NEnhuma, num ministério de porra nenhuma.

Lá fez carreira, foi acumulando gratificações e cargos e finalmente conseguiu um salário equivalente ao de presidente da república (oficialmente falando, da parte do presidente, afinal ele era pobre e pobre é sempre honesto. Ou não). Nunca se casou ou teve filhos. Ou seja, não pagava nenhuma pensão. Os pais já haviam morrido e essa era sua grande frustração; não ter o salário de aspone enquanto eles estavam vivos, para então poder ajudá-los. Quando eram vivos, fazia um agrado aqui, outro ali. Mas nunca havia ajudado como realmente queria.

 Os pais morreram com uma reles aposentadoria e sem plano de saúde. E, por ironia do destino, ele havia se tornado rico depois da morte dos pais, solteiro, sem filhos, sem ninguém mais para retribuir qualquer coisa. Retribuir para a sociedade era algo muito abstrato, e no fim ninguém havia retribuído porra nenhuma pra ele, a não ser seus velhos falecidos. Naquela altura, sentimento de gratidão era só com o orixá, e olhe lá. Filho de Omolú é justo até demais, e chato pra caralho. E estava até em dívida com o tal. Não ia ao terreiro desde sua faculdade.

Brasília tem um clima muito doido. Uma hora bate aquele calor de Bangu, e depois o mundo desaba em água. Depois do “expediente na repartição” (expressão que ele odiava), entrou no carro, dirigiu por meio quilômetro e o céu começou a desabar. Passou quase duas horas para chegar em casa, um trajeto que costumava fazer em 20 minutos, com trânsito pesado. Ele podia usar ônibus ou metrô, que seria muito mais rápido.

 Mas vir com esse papo ecológico pra quem nunca teve porra nenhuma, que depois conseguiu dirigir um bom carro... Hum! Ele preferia estar dentro do seu carrão importado fudido, como os nêgo da quebra falavam, num trânsito fudido e numa chuva fudida.

Ele e seus quarenta e poucos anos, dentro do carrão importado fudido. Demorou, mas enfim chegou nas redondezas de sua casa. Puto com o engarrafamento, resolveu passar num barzinho ao lado de casa e tomar umas. Barzinho, com happy hour de caipifruta. Não era boteco. Lá não tinha o velho Chico atrás do balcão, nem a Nezinha, nem o Tião tranca-rua, e nem as pingas em garrafa pet que chegavam do interior de qualquer canto, como acontecia na quebrada. Mas já havia se acostumado com o ambiente de gente branca e bonita, com roupa de aspone, como ele. E ele não era mais tão grato onde antes cresceu, assim que veio do Rio. Neguim engomado na quebrada ou é crente ou é cana (a depender da cara, se for lesado é crente, se for ligado é cana). E por um tempo ele achou que isso fosse preconceito de quem não morava lá.

Sentado sozinho, vendo a chuva e ouvindo as pessoas conversarem qualquer coisa, ele já ia pra sua quarta cerveja. Quanto então começou a ver aquele moleque negro montado numa bicicletinha colorida. Se não fosse tão novo, imaginaria que ele tivesse roubado a bike, ou camelo, como dizem em Brasília. Ele já havia sido contaminado pelo consciente coletivo morro abaixo, e se percebia, pensando como um idiota. Ele sabia que havia se tornado um idiota, mas não esperava nenhum desconto por isso. O ambiente havia o transformado a partir do momento que ele desistiu de transformar o ambiente. O preço era muito caro para a segunda opção.

Aprendeu isso na faculdade. Por mais que ele falasse, demonstrasse bons pensamentos e ideias, era só mais um preto fudido que acordava às 5 da manhã para pegar ônibus, enquanto seus colegas de curso chegavam de carro, fumavam pra caralho, pegavam as meninas gatinhas e no fim, só ofereciam uma carona pra ele até a rodoviária. Falavam sobre ideias, sobre dívida social, ” adoravam” ele, mas no fim ele se sentia um encosto, que seria largado na próxima parada de ônibus ou na rodoviária. E toda aquela galera bonita, cheia de boas intenções, não passava de jovens querendo aproveitar a vida como lhe fora apresentada. Ele achou que se aproximaria deles com seu intelecto, se achou aceito por um tempo e até tentou... Mas eles viam o mundo de outra forma. Da forma que, no fim, ele acabou vendo. Virando um aspone. Achou que perdeu tempo demais tentando transformar o ambiente, ou tentando fazer o ambiente melhor para ele num meio que antes não era dele.

E ele estava lá vendo o muleque na bike coloridinha, novinha. Se lembrou de sua infância. Do quanto queria ter uma bicicleta. O que mais impressionou foi ver Pretinho, como decidiu chama-lo, montado na bike sem as rodinhas, se equilibrando, fazendo manobras e rodopiando. Ele nunca tinha tido uma, tampouco aprendido a andar de bicicleta. Tentou uma vez, no Rio, com o filho da patroa de sua mãe. Começou a andar com as rodinhas. Depois que o pai do garoto as tirou e o “riquinho” aprendeu, ele começou a caçoá-lo. Falava que nunca iria aprender, porque era burro.

Então ele voltou à infância e se viu em Pretinho com a bike colorida. Era o filho de um garçom do bar. Descobriu quando o pai ordenou ao filho que não andasse na chuva. E o garotinho andava com uma destreza sem limites.
Eis que nosso aspone começa a conversar com Pretinho, que resolveu dar uma breve parada para retomar o fôlego.

- Bonita a bicicleta, quem te deu?

O garotinho olhou pro chão, torceu o guidom algumas vezes e respondeu:

- Foi o papai – apontando pro garçom.
- Que legal, quem te ensinou a andar?
- Foi o papai.
Aspone lembrou que seu pai também não sabia andar de bicicleta, tampouco havia tentado ensiná-lo, evidente. Haviam outras prioridades, justificava-se.

- E será que você pode me ensinar a andar?
- Hummmm, posso. Vou falar pro papai que vou dar a volta no bar e você me encontra lá atrás. Certo?
- Certo.

Aspone já estava na sexta cerveja e levemente bêbado. Ainda assim, ou por conta disso e por suas lembranças, resolveu ter lições de ciclismo com o garotinho. Deu a volta no comércio onde ficava o bar e o encontrou.
É óbvio que não daria certo. Além de a bicicleta ser muito pequena, ele estava bêbado. Mal sentou e foi ao chão. Pretinho riu sem parar. Aspone riu pela alegria que acabara de testemunhar. Combinou então que quando Pretinho estivesse maior, iria lhe presentear com uma grande bicicleta. Em contrapartida, ele iria ensiná-lo a andar.

Voltaram ao bar e ele foi falar com o pai do garotinho. Reafirmou a promessa de uma bicicleta grande, quando Pretinho estivesse maior. O pai não entendeu tudo aquilo. Depois riu e até falou que poderia ensinar  Aspone a andar de bike. Mas Aspone já havia feito o acordo com o garoto.

“Dê-me seu endereço e telefone, daqui a quatro anos os visitarei com uma bicicleta grande”, disse Aspone, que também pediu a conta e um taxi para ir embora. Estava muito bêbado e deixou o carrão importado fudido por lá. Cara consciente. Vamos ver daqui a quatro anos... Se ele vai cumprir a promessa, aprender a andar de bicicleta e finalmente retribuir algo a alguém.