terça-feira, junho 05, 2012

Botijãozinho


Uma formosura de mulher. O problema, disse ela, era que bebia muito. Mas era radiante, esbanjava bom humor e inocência, em seus 1,60m e 108 kg. 27 anos com uma molecagem de 15. Não sei se ela era sempre daquele jeito, talvez sim. Talvez ainda fosse uma adolescente.
Estava triste, mas alegre ao mesmo tempo. Queria um homem ou uma carona, o que viesse primeiro. Falei que eu era comprometido.  Ela duvidou e perguntou por minha mulher. Vi que seria difícil e resolvi falar que era viado. Tentava ser legal, mas eram mais de 100 kg querendo me devorar. Tive que ser um pouco escroto até ela resolver virar minha amiga.
Como disse antes, ela estava triste. Havia acabado de ser largada pelo companheiro.
 - Ele reclamava demais e não fazia nada. Antes falava que eu era grudenta. Me pedia para sair com as amigas e ficar menos no pé dele. Resolvi sair pro rocknroll. Comecei a chegar em casa 6h da manhã, hehehe.
- Mas você não pensou em chegar um pouco menos tarde, e realmente sair com suas amigas? , argumentei.
- Menos tarde? Ele vivia me chamando de gorda. Passou a não gostar mais da minha comida, e não fazia nada em casa. Você, seja sincero, me comeria? Eu estou tão gorda assim?
- Bem, você não é a pessoa mais em forma da cidade, mas você é legal, espontânea, divertida, uma boa conversa. E eu...
- Ah é, você é viado...
- Uhmm... Ok, isso mesmo.
Passam alguns segundos em silêncio.
-  Você bocejou, tá vendo? Todo mundo bocejou enquanto falava comigo hoje. Por quê?
- Bem... A iluminação desse lugar favorece. Dá um puta sono.
Depois que eu deixei claro que não daria carona para ela e, muito menos, satisfaria seus desejos sombrios, ela se acalmou e me escolheu pra amiga. Tudo bem, dos males o menor. Dizia que adorava rock, sobretudo gótico. “SO-BRE-TU-DO gótico! Hahaha”. Gordos e o humor... Lembrei de algumas bandas do estilo “sobretudo gótico”. The Cure, Siouxie And The Banshees... Ela falava: “ISSO, MUITO BOM!”, e cantava qualquer coisa que parecia ser em inglês.
Para cortar a cantoria bizarra, lembrei de um bar rocknroll que era perto do lugar onde ela falou que morava. Nunca havia ido lá, mas falei que gostaria de conhecer o local qualquer hora. Não naquele dia, deixei claro.
“Ahh, lá não é legal. Não posso ir mais. Me expulsaram de lá porque eu estava bêbada. Não é um bar rocknroll? Por que discriminam bêbados?”
À medida que a conversa fluía, botijãozinho achava mais ainda que era minha amiga e bebia minha cerveja. Ia e voltava do banheiro com certa frequência. Quando chegava, sentava no banco ao lado do meu e esbarrava em tudo. Parecia um terremoto. Como se não bastassem os quilos e beber minha cerveja, ainda fazia gordice.  Mas lembrava de pedir desculpa. Uma diva. E eu respondia que estava tudo bem, e realmente estava.
Passei a gostar de conversar com aquele minitanque rosa, com uma alma proporcional à largura do seu corpo. Eu a adorei desde o início. Sua origem humilde, espontaneidade e confiança em minha pessoa. Coisa do álcool, essas duas últimas, talvez.
Começou a falar de seu trabalho. Eu conhecia seus chefes, um casal de jornalistas. “Não gosto desse povo metido a besta. A filha da minha patroa só come coisa láitch. Nem sou empregada dela pra ouvir isso. Trabalho pra mãe dela”.
Pegou a cerveja e tentou se servir. Não havia mais nada. Eram quase cinco da manhã. Ela falou que ia pegar um ônibus e se despediu com um abraço. Depois me olhou com os olhos marejados, desejou boa sorte e foi embora.

sábado, maio 12, 2012

Meu rei


Meu rei é um cara esperto. Fala com todo mundo com um sorriso que você reconhece à distância, principalmente no escuro. Fiquei bróder dele quando eu não aceitei a pegadinha.
Ele lava o carro sem o dono pedir. Todos estranham quando vão embora e se deparam com o carro limpo. Daí aparece aquele negão gente boa, com um sorrizão, falando que decidiu fazer um agrado. O dono do carro não pensa duas vezes. Arranca uma nota de cinco ou de dez e dá para o Meu rei.
Ao invés de dar dinheiro, lhe paguei um sapo. “Eu te pedi para lavar meu carro? Você acha que eu vou te dar quanto, dez reais? Tentava demonstrar raiva, mas na verdade estava surpreso pela atitude dele.
Outros flanelinhas passaram a utilizar a mesma tática. Meu rei entrou em ação e repetiu meu discurso para eles: “O dono do carro pediu para você lavar o carro?”. Achei que Meu rei havia aprendido algo comigo e fiquei satisfeito. Mas o cara me superava.
Fiquei sabendo pelo segurança do bar que Meu rei havia criado uma firma do lava-jato picareta. Ele pedia para os outros flanelinhas, que na verdade eram drogados em busca de dinheiro para uma pedra de crack, lavarem todos os carros. Meu rei entrava no bar, falava com os donos dos carros e pegava o dinheiro primeiro, sem os outros flanelinhas saberem. Terceiriza a mão-de-obra, mas não paga nada por ela. A China é peixe pequeno perto do Meu rei.
Em pouco tempo, ele passou a ser o dono da área e impor regras entre os moradores de rua, prostitutas e outros flanelinhas: não aceita tráfico e nem roubo no local, afinal não quer chamar atenção da polícia e nem perder sua fonte de renda. Hoje, Meu rei só me pede cigarros. Nunca mais lavou meu carro novamente.