domingo, janeiro 17, 2021

A morte e o desconhecido

Ela: Por que ainda não se matou?
Eu: Porque você é muito otária.
Ela: Eu sei. Mas, é só por isso?

Pausa

Eu: Quero te fazer raiva.
Ela: O que mais?
Eu: Estou amando alguém. E quero voltar a Salvador e a Sarajevo.
Ela: Só por isso?

Eu: Minha vingança é me manter vivo.
Ela: E como era antes?
Eu: Muito aleatório. Mas, ainda assim, não valeria apena antecipar o encontro contigo.

Ela: Por que?
Eu: Você nunca me convenceu. Sempre pensei em você, em te encontrar no melhor momento possível. Dormindo, tranquilo. Mas você é tóxica, egoísta.
Ela: Então você não me ama?

Pausa

Eu: Já encontrei muita gente dormindo, querendo ou não. Amando ou não. Você nunca teve exclusividade comigo.
Ela: Como assim?

Pausa

Eu: Você é corna, e se deita com todo mundo.
Ela: Úi, queria exclusividade?

***

Ele desistiu.
Tinha acabado de perder o irmão.
Não deu conta.

Quando estamos sozinhos,
É mais fácil terminar tudo?
Pena que ele era muito talentoso,
E poucos sabiam disso.

Artista plástico de valor,
Que neste país ninguém dá.
Nem no suicídio.
Talvez, se fosse o tal do Raimundo Brito...

***

Covardia?
Não.

E se um dia eu não quiser mais viver?
Ter uns 70 e poucos anos, ou não.
Não ter mais ninguém no mundo, ou não.

Discutimos tantas coisas.
Mudamos tantas coisas.
Mas, e se eu cansar de viver?
Vão me condenar por isso?

Conversava ontem,
Com um amigo sobre a questão.
Após 10 minutos de conversa,
Um desconhecido apareceu.

Após 10 minutos de conversa,
O desconhecido fala que tentou se matar.
Dias desses.

Esse tema atrai desconhecidos,
Na rua.
Misteriosamente.

Falei que ele era jovem demais.
O recomendei a ter essa carta na manga,
Por mais tempo.
A única contra a morte.
O all win.

***

Deus é a junção de pensamento de todos os seres humanos. Parece uma explosão.

terça-feira, janeiro 12, 2021

Dilacerados e moribundos

O que define o tardio momento do levante? O acordar? O cansei da injustiça, seja qual ela for? 

O que define a mordaça, o subjulgar e a relação de poder é claro. Domínio psicológico, social e financeiro. Perda de entes queridos, privação do essencial à sobrevivência humana.

Liberdade é a cereja do bolo. Antes dela, há o fundamental: manter-se vivo. Ou apenas viver para garantir a sobrevivência de alguém que você considera mais precioso do que você. Isso é a demonstração máxima de amor.

Por que a reação ao máximo estado de opressão demora tanto? Por colocar em risco a vida de quem consideramos mais precioso do que nós? Por sermos subjulgados ao ponto de perdermos quase todas as forças?

O que falar das revoltas de escravos, seja na África ou nas Américas? Ou dos judeus que revidaram em Varsóvia?

Há um limiar, em que viramos "suicidas" e abrimos mão de tudo? Pelo o quê? Dignidade? Nada mais a perder além dela? Vingança, revolta? Não morrer como um rato, talvez?

O levante dos dilacerados e moribundos ainda são os mais respeitáveis de toda a história. Eles tiram forças de onde nenhuma outra pessoa, exército ou país jamais tirariam, ainda que tardiamente. Ainda que de forma fracassada.

Estratégia bélica é o que menos  importa. Não há controle sobre isso. A eles, algum alento. O doce e revoltoso gosto de falar: eu existo!